Na contramão das principais economias do mundo e por decisão unânime dos seus membros, o mês de setembro foi marcado pela decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil em elevar a taxa Selic em 0,25 p.p., para 10,75%.
Fonte: Manchester Investimentos
Banco central eleva raxa selic em 0,25 p.p. para 10,75%.
Devido à resiliência na atividade, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo (diferença entre o nível atual da atividade econômica e seu nível potencial), elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, o Comitê ressalva que a economia precisa de uma política monetária mais restritiva.
Apesar da alta de 0,25 pontos percentuais ser basicamente o movimento mínimo de juros, tanto o comunicado pós-reunião, como a ata divulgada posteriormente foram em tom duro, sugerindo que o Comitê poderá optar por acelerar o ritmo de aumento de juros na próxima reunião.
Fonte: Banco Central do Brasil
O que vem pela frente?
Para os próximos passos, o órgão não forneceu sinalizações claras, apontando apenas que o início deveria ser gradual, que permanecem dependente de dados e reforçam o firme compromisso de convergência da inflação à meta.
No entanto, em um dos trechos mais reveladores a autoridade mostra que o caminho atualmente projetado pelo mercado (Relatório Focus) para a taxa Selic – 11,50% até janeiro de 2025 e retorno para 10,50% até dezembro de 2025 – não seria suficiente para levar a inflação à meta.
Fonte: Banco Central do Brasil
O comunicado traz a tabela de projeções para o cenário de referência e coloca o IPCA em 3,7% em 2025 e 3,5% para o 1º TRI de 2026, números ainda distantes do centro da meta de 3%.
Desafios fiscais em foco
Ainda na ata, a autoridade cita que a conjunção de um mercado de trabalho robusto, política fiscal expansionista e vigor nas concessões de crédito às famílias segue indicando um suporte ao consumo e consequentemente à demanda agregada, justificando o aumento da taxa Selic.
No entanto, o cenário fiscal segue preocupante. O Banco Central enfatizou a importância de uma política fiscal sólida e transparente, e alertou que a percepção negativa do mercado sobre o crescimento dos gastos públicos e a sustentabilidade do arcabouço fiscal tem afetado os preços dos ativos e as expectativas econômicas.
E qual de fato é esse impacto?
Os reflexos já podem ser sentidos na curva de juros, que embute prêmio de risco e projeta a Selic próxima de 13% em 2025, com juros acima de 12% no longo prazo.
Se a preocupação do Copom e do mercado é sobre solidez das regras e boas práticas, setembro não trouxe alento.
Setembro não trouxe sinais de alívio no campo fiscal. O Projeto de Lei Orçamentária indicou que a consolidação fiscal depende quase exclusivamente do aumento de receitas. As compensações fiscais para a desoneração da folha de pagamento levantaram preocupações, principalmente com a ideia de contabilizar recursos esquecidos em contas bancárias como receita primária, uma proposta que o próprio Banco Central sinalizou ser contra as melhores práticas.
Além disso, já na última semana do mês o Relatório Bimestral de Receitas e Despesas desapontou o mercado que ao invés de ver novas restrições e aperto nas contas públicas, recebeu o oposto e viu um afrouxamento fiscal de R$ 1,7 bilhão.
Com os desafios postos a mesa, a próxima reunião do comitê de política monetária acontecerá nos dias 5 e 6 de novembro, e atualmente através de opções digitais negociadas na própria B3 o mercado atribui probabilidade 65% de chances de um aumento de 0,50%, o que levaria a taxa Selic para 11,25% ao ano.
Fonte: b3
Por fim, em um mês marcado por um cenário internacional favorável, com o mercado chinês subindo mais de 20% impulsionado pelo otimismo com novos estímulos governamentais, e o mundo celebrando o início do ciclo de corte de juros nos Estados Unidos – algo teoricamente positivo para mercados emergentes, incluindo o Brasil –, a sensação que fica é que, mais uma vez, estamos perdendo a chance de aproveitar esse momento.
No melhor estilo Brasil, ao menos nesse momento, parece que estamos escorregando na casca de banana jogada por nós mesmos.
Estados Unidos
Pela primeira vez desde 15 de março de 2020 quando cortou emergencialmente os juros para 0%, o Federal Reserve afrouxou as condições monetárias e baixou a sua taxa básica de juros: do intervalo 5,25%-5,50% para 4,75%-5,00%.
Fonte: Federal Reserve
Como de costume, pensando em próximos passos, tão importante quanto a decisão em si é a conferência posterior a decisão onde o mercado tenta ler qualquer detalhe que possa indicar o caminho a ser seguido.
Cenário desafiador, mas equilibrado
Apesar de ser vocal ao dizer que a batalha contra a inflação não está ganha, Powell também sinalizou pontos positivos, como acreditar no equilíbrio do momento já que estão com maior confiança de que a inflação está se movendo sustentavelmente em direção a 2% (meta da instituição) e julga que os riscos de atingir seus objetivos para emprego (criação de vagas) e inflação estão aproximadamente equilibrados.
Ainda em conferência pós-decisão, Powell reforça que os juros neutros provavelmente são acima do período antes da pandemia e que não estávamos voltando para o mundo de taxas ultra-baixas e que 50bps não deveria ser considerado o novo ritmo de cortes.
Dot plot
O gráfico de “dot plot” do Federal Reserve (FED) é uma ferramenta que mostra as projeções dos membros do Comitê de Política Monetária sobre a trajetória futura da taxa de juros nos EUA. Cada ponto no gráfico representa a expectativa de um membro em relação ao nível da taxa ao final de cada ano, nos próximos anos e no longo prazo.
Esse gráfico é importante para o mercado porque oferece uma visão das intenções do FED em relação à política monetária, ajudando a alinhar as expectativas dos investidores sobre o futuro dos juros e da economia.
O gráfico mostra que assim como o mercado, os membros do comitê também se encontram divididos, sendo que a maioria (10) dos dirigentes espera mais 50 pontos base de cortes esse ano ainda (trazendo o intervalo para 4,25% a 4,50%), enquanto 7 participantes esperam apenas mais 25bps, e 2 não esperam mais corte algum!
Fonte: Federal Reserve
Agora, o mercado começará a ajustar suas expectativas para a próxima reunião de juros, marcada para novembro. No entanto, antes que esse evento se aproxime, outro acontecimento deverá dominar o noticiário: as eleições presidenciais americanas, que terão seu primeiro turno em 5 de novembro.
De um lado, Donald Trump busca retornar à presidência; do outro, Kamala Harris tenta consolidar sua liderança. Com um cenário tão polarizado, o desfecho dessas eleições pode trazer ondas de incerteza, influenciando diretamente os mercados, que estarão atentos tanto às urnas quanto às próximas movimentações do Federal Reserve.